Após ficar fechado por quase 20 anos, a famosa sala de cinema foi ocupada por famílias sem-teto e virou tema de filme
Vanessa Nicolav
Cartaz do documentário “Cine Marrocos”, lançado em 2018 – Divulgação/ Cine Marrocos
A mistura entre realidade e criação, vida e sonho de moradores da ocupação Cine Marrocos, local que já foi considerado uma das mais prestigiadas salas de cinema de São Paulo, é o tema do filme, de mesmo nome, escrito e dirigido por Ricardo Calil.
Mais do que um documentário sobre a transformação desse local, o filme é um retrato sobre o poder do encontro. O encontro entre pessoas que lutam pelo direito à moradia, a magia do cinema e o poder da transformação gerados pela invenção.
O diretor conta que a ideia surgiu depois de visitar o espaço e ficar impressionado com a riqueza humana e cultural do local: na época, ali viviam cerca de 2 mil pessoas, de 17 países diferentes.
Aquelas pessoas que são muitas vezes invisibilizadas mereciam estar nessa vitrine linda que é a tela de cinema
“O que a gente quis fazer com o filme é que essas pessoas precisam não só de um teto, mas também precisam de tela, precisam de cultura, arte, fantasia, além da realidade, elas precisam de fantasia também”, aponta.
A produção envolveu um rico processo criativo com um grupo de moradores da ocupação, que durante dois meses ensaiaram cenas de filmes clássicos, exibidos durante o período auge da sala de cinema.
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“Existe um duplo sentido político nesses gestos. Primeiro dizer que um cinema não pode ficar fechado e ele não precisa ser só para elite ele pode ser aqueles moradores da ocupação. E o segundo é que aquelas pessoas que são muitas vezes invisibilizadas mereciam estar nessa vitrine linda que é a tela de cinema”, diz o diretor.
O filme, que foi realizado entre 2015, mostra, além da realidade e sonhos da ocupação Cine Marrocos, o episódio de reintegração de posse do prédio, ocorrido em 2016. Desde então, o problema de moradia em SP só piorou. Segundo dados da prefeitura, o número de pessoas em situação de rua aumentou 53% nos últimos 5 anos.
“A gente acredita que a luta por moradia é uma luta justa nobre importante. Porque ela tenta corrigir um erro básico da nossa sociedade, da nossa desigualdade social, que é o fato de ter gente sem casa e casa ser gente. É um absurdo que precisa ser corrigido”, pontua Calil.
O longa-metragem venceu o festival de documentários É Tudo Verdade em 2019. E atualmente pode ser assistido em plataformas online.
Brasil de Fato