Enquanto Marco Aurélio, Nunes Marques e Alexandre de Moraes entendem pela desnecessidade da negociação coletiva; Edson Fachin entende que ela é obrigatória
Na tarde desta quarta-feira, 19, o plenário do STF retomou o debate sobre a necessidade de prévia negociação coletiva com o sindicato dos trabalhadores para dispensa em massa de empregados.
Hoje, os ministros Marco Aurélio, Nunes Marques e Alexandre de Moraes votaram pela desnecessidade da negociação coletiva para a demissão em massa. Edson Fachin abriu divergência, assentando a obrigatoriedade da negociação. O debate continua amanhã, 20.
- Origem
O caso trata de mais de 4 mil funcionários da Embraer e da Eleb Embraer que foram demitidos em 2009. Naquela época, o sindicato dos trabalhadores e a associação dos trabalhadores ajuizaram uma ação na Justiça do Trabalho pedindo a nulidade da dispensa coletiva. Para os autores, não houve negociação prévia com o sindicato da categoria.
O tema foi parar no TST, que reconheceu a imprescindibilidade da negociação coletiva para a dispensa em massa de trabalhadores. As empresas, então, acionaram o Supremo sob o argumento de que não existe lei que obrigue a negociação prévia com o sindicato em caso de dispensa coletiva.
O caso começou a ser julgado este ano em plenário virtual, mas foi suspenso por pedido de destaque de Dias Toffoli. Naquela oportunidade, o relator, ministro Marco Aurélio, se manifestou pela desnecessidade de negociação coletiva considerada a dispensa em massa de trabalhadores, fixando a seguinte tese:
“A dispensa em massa de trabalhadores prescinde de negociação coletiva.”
- Veja o voto do relator.
O tema estava na pauta do dia 29 de abril, mas foi adiado para esta tarde.
- Desnecessidade da negociação coletiva
Marco Aurélio, relator, votou por prover o recurso extraordinário no sentido de ser desnecessária a negociação coletiva para dispensa em massa.
O decano afirmou que a iniciativa da rescisão, disciplinada no artigo 477 da CLT, é ato unilateral, não exigindo concordância da parte contrária, “muito menos do sindicato que congregue a categoria profissional”.
O ministro registrou que cumpre ao empregador proceder à anotação na CPTS, comunicar aos órgãos competentes e realizar, no prazo e na forma estabelecidos no dispositivo, o pagamento das verbas devidas. “É desinfluente a ruptura ser alargada”, disse.
Além disso, Marco Aurélio observou que não há vedação ou condição à despedida coletiva. Segundo o ministro, o tema observa a regência constitucional e legal do contrato individual de trabalho, presentes os preceitos fundamentais referentes à dignidade da pessoa humana, ao valor social do trabalho e à função social da empresa.
Assim, e por fim, o ministro votou por atender ao pedido da empresa para prescindir a negociação coletiva para a dispensa em massa.
Em breves manifestações, os ministros Nunes Marques e Alexandre de Moraes seguiram o entendimento do relator, no sentido de derrubar o entendimento do TST.
- Necessidade da negociação coletiva
Logo no início de seu voto, Edson Fachin deixou claro seu entendimento no sentido de que a negociação coletiva é imprescindível para a dispensa em massa. O ministro frisou que, na relação de trabalho, não se exige uma proteção abstrata do trabalhador, mas uma proteção concreta e real por parte do Estado e da comunidade.
O ministro frisou que as normas constitucionais – que garantem ao trabalhador a proteção das negociações coletivas – constituem garantias fundamentais constitucionalmente impostas contra toda e qualquer ação, seja do Poder Público, seja das entidades privadas, que possam mitigar o poder de negociação e fruição do direito social do trabalhador.
Diante do art. 7º da Constituição Federal, Edson Fachin concluiu pela impossibilidade de se admitir o rompimento em massa do vínculo de emprego sem a devida atenção da negociação coletiva. “É obrigatória a negociação coletiva prévia à demissão em massa de empregados”, finalizou.
- Sustentações orais: partes e amici curiae
Pelas empresas recorrentes, o advogado Carlos Vinicius Amorim afirmou que o TST criou uma nova regra para a dispensa em massa, qual seja, a imprescindibilidade da negociação coletiva. De acordo com o patrono, não há vácuo ou lacuna na legislação trabalhista a respeito da matéria. “Por mais erudita que seja a decisão do TST, o fato é que ela não encontra respaldo na legislação brasileira”, afirmou. Ao defender que a Justiça do Trabalho invadiu competência de outro Poder (Legislativo), o patrono pediu pela total procedência da ação, a fim de assentar a desnecessidade de acordo com sindicato para a dispensa em massa.
O advogado Aristeu César Pinto Neto, representando o Sindicato dos Metalúrgicos de São José dos Campos/SP, defendeu que há 12 anos de jurisprudência reafirmando a necessidade de acordo com o sindicato, a fim de se evitar o desemprego. “O que se pede é a negociação e o diálogo social, entre a empresa e o sindicato”, afirmou. O advogado, então, pediu o desprovimento do recurso.
No mesmo sentido, manifestou-se o Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias de Construção de Aeronaves. Pelo advogado Renato Rua de Almeida, o sindicato se posicionou pela validade da decisão do TST, “não havendo na oportunidade qualquer óbice legal para que fosse impedida a negociação prévia”. “Para evitar o retrocesso social (…) espera-se o desprovimento do recurso extraordinário”, finalizou.
O advogado Mauro Menezes, pelos Sindicatos dos Trabalhadores nas Indústrias Metalúrgicas da Bahia, explicou que uma despedida coletiva não é a mera justaposição de despedidas individuais. Para o patrono, a negociação é o meio saudável e constitucionalmente adequado para que se esgotem todas as alternativas de diálogos entre as partes sociais para que se chegue a algo distinto do trauma que é perda generalizada de empregos.
“A modernização das relações de trabalho não implica um vale-tudo, uma carta branca para que haja dispensas coletivas sem sequer a viabilização de alternativas menos gravosas do ponto de vista econômica e social.”
Por outro lado, a CNI – A Confederação Nacional da Indústria, por meio do advogado Eduardo Albuquerque Santana, defendeu que a decisão recorrida, do TST, representou uma invasão de competência do poder Legislativo. De acordo com o patrono, a CF é expressa quando quer atribuir a algum dos Poderes a função típica de outro Poder, “e nesse caso não há qualquer autorização (…) o que o TST fez foi, ao fim e ao cabe, legislar”.
A advogada Marilda de Paula Silveira, falando pela CNT – Confederação Nacional do Transporte, afirmou que é necessária uma lei complementar que trate dessa matéria, a fim de suprir a ausência legislativa da negociação coletiva sobre dispensa coletiva. A confederação, então, manifestou-se no sentido de que a Corte reconheça a ausência de obrigatoriedade de negociação prévia de negociações coletivas.
A ABMT – Associação Brasileira de Magistrados do Trabalho, pela advogada Carolina Tupinambá, defendeu que a negociação coletiva é crucial para que os efeitos de uma dispensa coletiva sejam minimizados: “trabalhador não pode sofrer sozinho as consequências de uma crise econômica”, afirmou.
O advogado Ricardo Quintas Carneiro, representando o Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias Metalúrgicas de Belo Horizonte e Contagem, afirmou que as dispensas coletivas não podem ser equiparadas com as dispensas individuais. “O diálogo social promovido concretamente é constitutivo do Estado Democrático de Direito e, como tal, deve ser incentivado pelas empresas e sindicatos”, enfatizou.
Finalizando as manifestações, o PGR Augusto Aras observou que o Brasil é signatário da Convenção 158 da OIT, que trata do término da relação de trabalho por iniciativa do empregador. Segundo o PGR, a norma internacional é protetiva ao trabalhador, porque não admite a demissão em massa dos trabalhadores sem prévia comunicação e negociação com a representação dos trabalhadores. Aras salientou que a demissão pode acontecer, mas não pode deixar os trabalhadores desamparados. Por fim, o PGR manifestou-se pelo desprovimento do RE.
- Processo: RE 999.435
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